244ª Sessão Ordinária do Tribunal do CADE, realizada em 19 de março de 2025.
Pautas, atas e áudio da sessão disponíveis em https://www.gov.br/cade/pt-br
Destaques do Poder Judiciário
Justiça Federal defere pedido de suspensão de medida preventiva contra a Apple
A Justiça Federal do Distrito Federal (“JFDF”) concedeu mandado de segurança[^1] para determinar a suspensão da medida preventiva adotada pela Superintendência-Geral do CADE (“SG”) contra Apple Inc. e Apple Services LATAM LLC (“Apple”)[^2].
A investigação teve origem em janeiro de 2023, a partir de representação apresentada pelo Ebazar.Com.Br. Ltda. (“Mercado Livre”). Segundo o Mercado Livre, a Apple estaria abusando da posição dominante de sua loja de aplicativos App Store para impor regras anticompetitivas em seus Termos e Condições de Uso (“T&Cs”), proibindo que desenvolvedores de aplicativos (i) distribuam bens e serviços digitais de terceiros fora do ecossistema Apple, (ii) façam referência a sistemas de pagamento de terceiros na App Store e (iii) façam transações na App Store por meio de sistema de pagamentos de terceiros. Em outubro de 2023, o Mercado Livre apresentou nova petição solicitando a concessão de medida preventiva, alegando que a empresa estaria lançando novos produtos e serviços que estariam sendo limitados pela Apple em razão dos T&Cs. Em novembro de 2024, a SG decidiu instaurar Processo Administrativo e deferir o pedido de medida preventiva, determinando, em síntese, que a Apple deixe de aplicar políticas internas que proíbem os desenvolvedores de (i) comunicar ou direcionar os usuários para produtos/serviços fora dos aplicativos iOS (*anti-steering*), (ii) oferecer alternativas de pagamento para usuários que fazem compras no aplicativo, (iii) distribuir seus aplicativos iOS por canais que não a App Store da Apple e (iv) usar sistemas de pagamentos em aplicativos (*in-app*) que não sejam da Apple. A Apple interpôs Recurso Voluntário, ainda pendente de julgamento pelo Tribunal do CADE.
Em paralelo, a Apple impetrou Mandado de Segurança com pedido de tutela de urgência para suspender os efeitos da decisão da SG, alegando, dentre outras razões, que a medida preventiva impôs obrigações que vão além da mera cautela, configurando antecipação de mérito ao determinar a reengenharia de seu modelo de negócios. Em dezembro de 2024, o Juízo da 14ª Vara Federal Cível deferiu o pedido de tutela de urgência por entender que a medida seria desproporcional, dado que as obrigações alterariam de forma estrutural o modelo de negócios da Apple, além do prazo para cumprimento da obrigação ser curto, de apenas 20 dias. A concessão da tutela de urgência acabou sendo revertida pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região em 5 de março de 2025, com fundamento na existência de indícios suficientes de potencial lesão irreparável ao mercado consistente em barreiras para oferta de produtos e serviços alternativos no sistema iOS, além de urgência decorrente da constante inviabilização de entrada de rivais no setor.
Em 17 de março, contudo, o Juízo da 14ª Vara Federal deferiu o mandado de segurança em sede de sentença, determinando a suspensão da medida preventiva imposta pela SG até decisão final de mérito do CADE. Segundo o Juízo, “*a medida preventiva imposta pelo CADE está eivada do vício da desproporcionalidade, conforme já sedimentado por este Magistrado na decisão que deferiu o pedido liminar, cujos fundamentos adoto como razões de decidir*”. O CADE recorreu da decisão.
Destaques da Superintendência-Geral do CADE
SG não conhece operação envolvendo aquisição de planta industrial não operacional
A SG decidiu não conhecer operação[^3] envolvendo a aquisição, pela Klabin S.A. (“Klabin”), de uma planta industrial não operacional, incluindo imóvel e equipamentos relacionados, de propriedade da Kimberly-Clark Brasil Indústria e Comércio de Produtos de Higiene Ltda. (“Kimberly-Clark”).
A operação consistiu na aquisição, pela Klabin, de uma planta industrial não operacional, incluindo imóvel e determinados equipamentos relacionados, de propriedade da Kimberly-Clark localizada em Correia Pinto/SC. As Requerentes notificaram a operação *ad cautelam*, argumentando que a operação não seria de notificação obrigatória, dado que não envolveria aquisição de parte de empresa, nos termos do art. 90, II, da Lei nº 12.529/2011. Em especial, o ativo não seria operacional há mais de 4 anos, sendo que (i) não seria essencial às atividades da compradora, dado que anteriormente era destinado à produção de papéis para fins sanitários (*tissue*), segmento em que o Grupo Klabin não atua; (ii) não teria destinação empresarial específica, podendo ser destinado para diferentes atividades econômicas; e (iii) seria incapaz de conferir aumento de capacidade produtiva.
De fato, a SG decidiu não conhecer a operação. Segundo a SG, “*com base nas informações prestadas, entende-se que o Ativo-Alvo (imóvel e equipamentos), embora tenha destinação específica (\…), não é essencial para a atividade-fim do negócio da Klabin para o qual os ativos serão direcionados, tampouco possuem o condão de conferir incremento à capacidade produtiva da adquirente*”. Ademais, “*ainda que a Klabin resolva utilizar o imóvel para fins produtivos em algum dado e incerto momento no futuro (\…), infere-se que isso não ocorreria dentro de um espaço de tempo razoável*”[^4].
SG arquiva investigação contra SABESP e ARSESP
A SG decidiu arquivar investigação[^5] que buscava apurar suposto aumento arbitrário de lucros por Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (“SABESP”) e Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (“ARSESP”), decorrente da rescisão unilateral de contratos de fornecimento de água e esgoto.
A investigação foi instaurada em fevereiro de 2025, a partir de representação com pedido de medida preventiva apresentada pelo Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (“Sindusfarma”). Segundo o Sindusfarma, a SABESP e a ARSESP teriam rescindido unilateralmente centenas de contratos de demanda firme de fornecimento de água e esgoto, consistente em contratos com descontos por aquisição de volumes, desde julho de 2024, logo após a privatização da SABESP. Segundo o Sindusfarma, a rescisão unilateral dos contratos representaria conduta anticompetitiva consistente no abuso de posição de dominância visando o aumento arbitrário de preços. Dessa forma, o Sindusfarma solicitou a instauração de investigação, bem como medida preventiva para suspender os efeitos da rescisão contratual para todas as indústrias farmacêuticas impactadas no estado de São Paulo.
A SG, contudo decidiu arquivar a investigação. Segundo a SG, “*o presente feito traz ao conhecimento do Cade discórdia comercial entre as partes, tratando-se, portanto de lide privada apenas, não havendo indícios mínimos de infração à ordem econômica. Não se pretende afirmar, com isso, que o fato não possa gerar prejuízos ou aumentados custos à Representante ou a outros agentes do mercado. Entretanto, conforme já pacificado por este Conselho, os órgãos de defesa da concorrência não se prestam a corrigir discordâncias comerciais estabelecidas entre particulares*”[^6]. O Sindusfarma recorreu da decisão.
SG impõe medidas preventivas contra tabelamento de honorários em serviços de saúde
A SG decidiu impor medidas preventivas no âmbito de duas investigações que buscam apurar suposto tabelamento de honorários de serviços de saúde.
A primeira investigação[^7] teve origem em representação apresentada pelo Ministério Público do Maranhão (“MP-MA”). Segundo o MP-MA, existiria investigação criminal contra a Sociedade de Médicos Cardiovasculares do Maranhão (“Cardiovasc”) com o objetivo de apurar suposta formação de cartel em procedimentos cardiovasculares em São Luís do Maranhão. Em especial, após congregar todos os cirurgiões cardíacos do município de São Luís/MA, a Cardiovasc estaria cobrando unilateralmente valores padronizados para realização de cirurgia cardíaca. A SG, então, encaminhou ofícios solicitando a manifestação da Cardiovasc, operadoras de planos de saúde e hospitais da região.
Após as manifestações, a SG decidiu instaurar Processo Administrativo e impor medida preventiva. Segundo a SG, “*é possível verificar indícios da adoção das seguintes práticas anticompetitivas pela Cardiovasc: \[i\] Constituição de sociedade com vistas à monopolização de mercado; \[ii\] Uniformização dos preços dos honorários cobrados dos planos de saúde por seus associados; \[iii\] Aumento abusivo dos valores dos honorários médicos, frente aos anteriormente praticados e aos adotados em outras unidades da federação; \[iv\] Limitação à prestação de serviços médicos fora do âmbito da Cardiovasc, por meio da exigência de exclusividade, impedindo a concorrência efetiva entre essa sociedade e os médicos individualmente considerados*”[^8]. A medida preventiva determina que a Cardiosvac se abstenha de aplicar tabela de honorários médicos ou editar novas tabelas ou documentos com efeitos similares, além de interromper a exigência de exclusividade de médicos.
A segunda investigação[^9] teve origem em representação com pedido de medida preventiva apresentada por pessoa física contra o Conselho Federal de Odontologia (“CFO”). Segundo a representação, o CFO estaria descumprindo a decisão proferida pelo CADE em Processo Administrativo[^10] que proibiu Conselhos de Odontologia de sancionarem cirurgiões-dentistas pelo oferecimento de descontos. Em especial, o CFO teria promovido em seu site institucional e página do Instagram uma publicação contrária ao oferecimento de descontos no período da “Black Friday”, associando a concessão de descontos em serviços odontológicos a infrações disciplinares, as quais teriam sido reproduzidas por 24 Conselhos Regionais de Odontologia.
A SG instaurou então Inquérito Administrativo e concluiu existirem indícios de que os Representados estariam veiculando na Internet publicações associando indevidamente a concessão de descontos na prestação de serviços odontológicos à configuração de infrações proibidas pelo Código de Ética Odontológica. Dessa forma, a SG concedeu medida preventiva para determinar que o CFO e 24 Conselhos Regionais de Odontologia excluam de suas redes sociais publicações que associem a concessão de descontos em serviços odontológicos à configuração de ilícitos.
Destaques da Sessão de Julgamento
Tribunal restringe medida preventiva que suspendia direitos políticos da CA Investment na Eldorado
O Tribunal do CADE decidiu, por maioria, restringir o objeto de medida preventiva consistente na suspensão dos direitos políticos da C.A. Investment (Brazil) S.A. (“CA Investment”) sobre a Eldorado Brasil Celulose S.A. (“Eldorado”)[^11].
A investigação teve origem em outubro de 2024, a partir de representação com pedido de medida preventiva feita pela Eldorado. A Eldorado é uma empresa de celulose com atuação nacional, enquanto a CA Investment é uma holding controlada pela Paper Excellence, empresa estrangeira que atua no mercado de celulose a nível mundial. Segundo a Eldorado, a CA Investment teria adquirido participação societária na Eldorado a partir de negociações que se iniciaram em 2017. Contudo, a partir do investimento na Eldorado, a CA Investment teria passado a tomar medidas incompatíveis com os interesses da Eldorado para beneficiar a Paper Excellence, como o acesso a informações sensíveis e utilização do poder de voto e veto para prejudicar decisões estratégicas da Eldorado. Segundo a Eldorado, as medidas permitiriam à Paper Excellence se valer do momento de expansão do mercado nacional de celulose para consolidar sua posição de dominância em nível global, e teriam como finalidade prejudicar um concorrente no momento em que a CA Investment planeja entrar no mercado nacional. Nesse sentido, a Eldorado solicitou medida preventiva para suspender os direitos políticos da CA Investment sobre a própria Eldorado.
De fato, a SG determinou a conversão do Procedimento Preparatório em Inquérito Administrativo e deferiu o pedido de medida preventiva da Eldorado. Segundo a SG, existiriam identificou indícios de que a CA Investment estaria se valendo de direitos políticos para prejudicar planos de expansão da Eldorado, enquanto a CA Investment estaria planejando, ela própria, construir nova planta no Brasil. Dessa forma, a SG impôs medida preventiva para determinar a suspensão dos direitos políticos da CA Investment sobre a Eldorado. A CA Investment apresentou Recurso Voluntário ao Tribunal do CADE alegando, em síntese, que (i) o CADE não teria competência para analisar condutas advindas de participações societárias minoritárias em caso que não preencheu os requisitos para notificação obrigatória de ato de concentração ao CADE; e (ii) a medida preventiva seria desproporcional e poderia prejudicar a racionalidade dos investimentos da CA Investment. O Recurso Voluntário foi distribuído à relatoria do Conselheiro Victor Fernandes.
Durante a 244ª SOJ, o Conselheiro Relator apresentou voto pelo provimento parcial do Recurvo Voluntário, especialmente para restringir o escopo da medida preventiva. Segundo o Conselheiro, o CADE teria competência para analisar condutas anticompetitivas implementadas por meio de participações societárias cruzadas, ainda que tais participações não tenham sido submetidas à análise do CADE no âmbito do controle de estruturas, pois “*parece incompatível com a própria lógica normativa da política de defesa da concorrência vaticinar que uma matéria pode ser analisada no controle de estruturas, mas não pode ser apreciada no controle de condutas*”. Nesse sentido, a probabilidade do direito (*fumus boni iuri*) estaria comprovada pelas evidências de atos com o objetivo de retardar ou impedir a expansão da capacidade produtiva da Eldorado, enquanto o perigo na demora (*periculum in mora*), no potencial prejuízo à produção no mercado.
Não obstante, o Relator destacou que “*a supressão de todos os direitos políticos priva o acionista minoritário de salvaguardas fundamentais contra potenciais decisões prejudiciais a seus interesses patrimoniais legítimos*”. Nesse sentido, o Relator votou para reestabelecer os direitos políticas da CA Investment sobre a Eldorado, com exceção de direitos sobre projeto de expansão indicado pela Eldorado como tendo sido obstaculizado pela CA Investment. Ademais, o Relator determinou a implementação de mecanismos de governança para se mitigar riscos de compartilhamento de informações sensíveis.
A maioria dos demais membros do Tribunal acompanhou o voto do Relator, ficando vencido o Conselheiro Carlos Jacques, que votou para não restringir o escopo da medida preventiva, considerando que os demais direitos políticos também poderiam ser utilizados para prejudicar atividades da Eldorado. Ademais, o Conselheiro José Levi Mello do Amaral Júnior apresentou voto divergindo da fundamentação adotada pelo Relator, mas seguindo o dispositivo.
Tribunal condena cartel em mercado de tubos para imagem colorida
O Tribunal do CADE decidiu[^12], por unanimidade, condenar duas empresas e nove pessoas físicas por participação em cartel no mercado internacional de tubos para imagem colorida com efeitos no Brasil.
A investigação teve origem em 2013, a partir do desmembramento, em razão da dificuldade de notificação de determinados representados, de Processo Administrativo[^13] que condenou a formação de cartel internacional com efeitos no Brasil entre os anos de 1995 e 2007 no mercado de tubos para imagem colorida (“CPT’), uma modalidade de tubos de raios catódicos. Após o desmembramento, os representados no Processo Administrativo desmembrado foram citados por edital e não apresentaram defesa. A SG declarou a revelia dos representados e remeteu os autos ao Tribunal do CADE com recomendação de condenação parcial.
Durante a 244ª SOJ, a Conselheira Relatora Camila Cabral Pires Alves apresentou voto pela condenação da maioria dos representados. Segundo a Relatora, a revelia implica confissão dos fatos. Ademais, “*a materialidade e autoria das condutas ilícitas foram comprovadas com base em um extenso conjunto de provas*”. Em especial, a Relatora ressaltou documentos com valor de prova direta, como trocas de e-mails combinando preços, bem como provas indiretas, como planilhas de preços, anotações de reunião, entre outros. Não obstante, a Conselheira Relatora decidiu arquivar a investigação em relação a uma pessoa física por entender que declarações unilaterais de signatários do Acordo de Leniência e TCCs, bem como um documento produzido por membros do cartel, não seria suficiente para comprovação da materialidade da conduta. Para o cálculo da multa das pessoas jurídicas, a Relatora entendeu necessário aplicar multa entre 6.000 UFIR e 6.000.000 UFIR, considerando a ocorrência da conduta durante a vigência da Lei nº 8.884/1994 e ausência de informações sobre faturamento bruto. Nesse sentido, a Relatora considerou como base de cálculo estimativas de faturamento baseadas no Processo Originário, com aplicação de alíquota de 15%. Para as pessoas físicas, aplicou-se alíquota de 15% sobre a multa das pessoas jurídicas em que trabalhavam. A soma das multas alcançou montante de cerca de R\$ 18,5 milhões. Os demais membros do Tribunal acompanharam o voto da Relatora.
Tribunal arquiva investigação de cartel na construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, arquivar processo administrativo que investigou suposta formação de cartel na construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte em Xingu/PA em relação a todos os representados[^14].
A investigação teve origem em setembro de 2016, a partir de Acordo de Leniência firmado por Construtora Andrade Gutierrez S.A. (“Andrade Gutierrez”) e duas pessoas físicas. Segundo os lenientes, existiriam evidências de formação de cartel entre 2009 e 2011 envolvendo a Andrade Gutierrez, Construções e Comércio Camargo Corrêa S.A. (“Camargo Corrêa”) e Construtora Norberto Odebrecht S.A. (“Odebrecht”), bem como 5 pessoas físicas, para fixar preços e dividir o objeto do leilão para construção e exploração da Usina Hidrelétrica de Belo Monte mediante (i) divisão do mercado, (ii) troca de informações concorrencialmente sensíveis e (iii) alinhamento de práticas comerciais. Dessa forma, a SG instaurou investigação, recomendando ao final a condenação dos representados. O caso foi distribuído à relatoria do Conselheiro Victor Fernandes.
Durante a 244ª SOJ, contudo, o Conselheiro Relator apresentou voto pelo arquivamento da investigação em relação a todos os representados. Segundo o Relator, a pretensão punitiva do CADE estaria prescrita em relação a uma das pessoas físicas, dado que a última evidência envolvendo o representado teria mais de 6 anos, sendo que o representado teria completado 70 anos de idade, de forma que o prazo prescricional seria a metade do prazo de 12 anos. Ademais, as provas de formação de cartel não seriam suficientes para comprovação da materialidade da conduta, dado que seriam essencialmente baseadas em declarações unilaterais de colaboradores e registros de agenda e de controle de acesso a edifícios. Além disso, existiriam inconsistências nos relatos dos lenientes, bem como justificativas alternativas legítimas para as condutas atribuídas aos representados, como racionalidade econômica para desistência de participação em licitação em razão do baixo potencial de retorno financeiro, ao invés de tratar-se de mera supressão de proposta. Por fim, muitas das informações supostamente sensíveis compartilhadas eram públicas e se deram em contexto de cooperação legítima incentivada pelo Governo Federal, considerando a complexidade do projeto. Não obstante, o Conselheiro Relator votou pela homologação do Acordo de Leniência, considerando a colaboração dos lenientes e a apresentação de conjunto probatório que ajudou a aprofundar a investigação. Os demais membros do Tribunal acompanharam o voto do Conselheiro Relator.
Tribunal declara descumprimento de TCC no setor de academias
O Tribunal do CADE decidiu, por maioria, reconhecer o descumprimento de Termo de Compromisso de Cessação (“TCC”)[^15] firmado pela GPBR Participações Ltda (“Wellhub”, anteriormente “Gympass”) no âmbito de investigação[^16] que buscava apurar supostas relações de exclusividade no setor de plataformas digitais agregadoras de academias de ginástica.
Em setembro de 2022, o Tribunal do CADE homologou TCC apresentado pela Wellhub para suspender investigação que buscava apurar a imposição de cláusulas de exclusividade no setor de plataformas digitais agregadoras de academias de ginástica. Por meio do TCC, a Wellhub assumiu, dentre outras obrigações, o compromisso de (i) não firmar acordos de exclusividade com clientes corporativos, (ii) restringir acordos de exclusividade com até 20% das academias de sua rede credenciada por município ou zonas de grandes cidades e (iii) apenas celebrar e manter acordos de exclusividade com academias se tal obrigação for concedida como contrapartida à concessão de investimentos (garantias de volume mínimo baseado em meta de aumento de frequentadores associados à Wellhub nas academias parceiras).
Em junho de 2024, contudo, as redes de academia PowerLife Gym Academia Ltda. (“PowerLife”) e Tecfit Brasil Ltda. (“Tecfit”) apresentaram denúncia de descumprimento do TCC, alegando que a Wellhub estaria forçando relações de exclusividade sem contrapartida financeira. Dessa forma, a SG encaminhou ofícios a outras academias. Ademais, durante o curso da instrução, outras academias apresentaram denúncias de descumprimento do TCC. Ao final da instrução, a SG opinou pelo reconhecimento do descumprimento integral de cláusula do TCC, por entender que existiriam indícios suficientes de descumprimento da obrigação de manter acordos de exclusividade com academias apenas se tal obrigação for concedida como contrapartida à concessão de investimentos. Segundo a SG “*diante do diminuto retorno financeiro causado pelos descontos progressivos, as academias se veem forçadas a contratar a exclusividade a fim de se evitarem os descontos por volume. Todavia, há que se relembrar que um dos argumentos trazidos em sede de denúncia desenvolveu-se no sentido de que, mesmo aderindo ao contrato de exclusividade, o valor repassado à academia parceira da Wellhub mostrou-se inferior ao faturamento da academia em situação de não contratação da exclusividade*”[^17].
Durante a 244ª Sessão Ordinária de Julgamento (“SOJ”), o Presidente Alexandre Cordeiro apresentou Despacho reconhecendo o descumprimento integral de cláusula do TCC. Segundo o Presidente, existiriam indícios de políticas de descontos progressivos e outros mecanismos para forçar relações de exclusividades com academias, sendo que não existiriam provas de repasse de investimentos às academias em contrapartida à exclusividade. Nesse sentido, o Presidente determinou que o Inquérito Administrativo voltasse a tramitar em face da Wellhub, bem como se aplicasse a medida preventiva vigente à época, limitada nos seguintes termos: (i) perda dos efeitos dos contratos de exclusividade realizados a partir da assinatura do TCC até a data da decisão do Tribunal e (ii) proibição da realização de qualquer novo contrato de exclusividade a partir da publicação da decisão do Tribunal. Não obstante, o Presidente entendeu não ser aplicável a cláusula que previa multa de R\$ 3.000.000,00 por descumprimento do TCC, dado que “*Mesmo que não tenha se desincumbido do seu ônus probatório, mesmo não sendo possível retornar ao status quo ante e mesmo havendo descumprimentos substanciais, compreendo que a aplicação da multa, no montante referido, neste momento processual, pode não se mostrar proporcional*”. Os Conselheiros José Levi e Camila Cabral apresentaram votos divergindo, respectivamente, da não aplicação de multa e da não utilização pela SG de procedimentos específicos para averiguação de descumprimento do TCC. Dessa forma, o TCC foi homologado pela maioria do Tribunal.
[^1]: Mandado de Segurança nº 1097967-08.2024.4.01.3400.
[^2]: Processo Administrativo nº 08700.009531/2022-04.
[^3]: Ato de Concentração nº 08700.001840/2025-71.
[^4]: Parecer nº 153/2025/CGAA5/SGA1/SG.
[^5]: Procedimento Preparatório nº 08700.001688/2025-26.
[^6]: Nota Técnica nº 18/2025/CGAA11/SGA1/SG/CADE.
[^7]: Processo Administrativo nº 08700.005708/2020-23.
[^8]: Nota Técnica nº 21/2025/CGAA11/SGA1/SG/CADE.
[^9]: Inquérito Administrativo nº 08700.008995/2023-76.
[^10]: Processo Administrativo n° 08700.002535/2020-91.
[^11]: Recurso Voluntário nº 08700.009572/2024-54.
[^12]: Processo Administrativo nº 08700.010731/2013-00.
[^13]: Processo Administrativo 08012.002414/2009-92.
[^14]: Processo Administrativo nº 08700.006377/2016-62.
[^15]: Requerimento de TCC nº 08700.006611/2021-19.
[^16]: Inquérito Administrativo nº 08700.004136/2020-65.
[^17]: Nota Técnica nº 47/2024/UCD-SG/SG/CADE.