245ª e 246ª Sessões Ordinárias do Tribunal do CADE, realizadas em 09 e 23 de abril de 2025.
Pautas, atas e áudio da sessão disponíveis em https://www.gov.br/cade/pt-br
Destaques do Poder Judiciário
STJ mantém decisão que rejeitou pedido de busca e apreensão do CADE
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a Recurso Especial[1] interposto pelo CADE contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) que rejeitou pedido de busca e apreensão em investigação envolvendo suposto cartel no mercado de trigo na região Nordeste.
O CADE apresentou Ação Cautelar de Busca e Apreensão para coletar documentos, computadores, discos, filmes, papéis e objetos, com autorização para a quebra de lacres, destruição de obstáculos e arrombamento de portas, em qualquer dos estabelecimentos de empresas investigadas por suposta formação de cartel em mercados de trigo na região Nordeste, mais especificamente nos estados do Ceará e Rio Grande do Norte (o alegado “Cartel do Trigo”). A Ação do CADE foi deferida em primeira instância, mas o TRF-5 reverteu a decisão por entender que a busca era excessivamente genérica, sem restrição de ordem ou tempo, além de carecer de imprescindibilidade. Segundo o TRF-5, as investigações teriam se iniciado em 2007 e seriam lastreadas unicamente em depoimentos de ex-colaborador de uma das empresas, de forma que a medida “pretende uma busca genérica, na esperança de encontrar elementos que ele próprio desconhece e de lograr identificar papéis ou documentos virtuais que possam incriminar os denunciados”, pois “como se buscar, v. g., nos depósitos de lixo e nas gavetas da agravante, documentos e papéis que teriam tido curso em 2007?”.
O CADE recorreu da decisão, alegando que o acórdão (i) não teria enfrentado todos os argumentos, em especial a pertinência da medida cautelar para produzir provas complementares e (ii) teria ignorado outros indícios apontados pelo CADE para justificar a medida cautelar. O Ministro Relator Teodoro Silva Santos, contudo, considerou que o acórdão do TRF-5 foi devidamente fundamentado. Segundo o Relator, o Tribunal não é obrigado a rebater individualmente cada uma das alegações das partes, sendo que “o acórdão recorrido apresentou fundamentação concreta e suficiente para dar suporte às suas conclusões, inexistindo desrespeito ao dever judicial de se fundamentar as decisões judiciais. O que se denota é mero inconformismo da parte recorrente com o resultado do julgamento que lhe foi desfavorável”. Dessa forma, o STJ negou provimento ao Recurso Especial, mantendo a decisão do TRF-5.
JFDF indefere Mandado de Segurança que buscava anular medida preventiva do CADE contra o Itaú
A Justiça Federal do Distrito Federal (JFDF) rejeitou Mandado de Segurança[2] impetrado pelo Itaú Unibanco S.A. (Itaú) para anular medida preventiva adotada pela Superintendência-Geral do CADE (SG) em investigação que busca apurar suposto abuso de posição dominante em sistemas de arranjos de pagamento via cartão de crédito.
Em outubro de 2024, a Superintendência-Geral do CADE instaurou investigação a partir de representação com pedido de medida preventiva apresentada pelo Ministério Público Federal junto ao CADE (MPF/CADE)[3] para apurar suposto abuso de posição dominante, pelo Itaú, em sistemas de arranjos de pagamento via cartão de crédito. Segundo a SG, existiriam indícios de que o Itaú estaria criando obstáculos para carteiras digitais rivais, especialmente ao recusar transações via cartões de crédito enquanto permite que as mesmas transações sejam realizadas nos seus próprios canais. Em fevereiro de 2025, a SG impôs medida preventiva para que o Itaú cessasse a conduta, sob pena de multa diária de R$ 250.000,00. O Itaú interpôs Recurso Voluntário, pendente de julgamento pelo Tribunal do CADE. Em paralelo, o Itaú impetrou Mandado de Segurança com pedido de liminar requerendo a anulação da medida preventiva. Segundo o Itaú, a medida preventiva seria (i) desproporcional e não isonômica, dado que rivais adotam práticas semelhantes e não são alvo de medidas equivalentes, além de (ii) ferir o direito ao contraditório e ampla defesa, em razão de sigilo atribuído às respostas apresentadas no teste de mercado.
A Juíza Liviane Kelly Soares Vasconcelos, da 20ª Vara da JFDF, concedeu medida liminar para suspender os efeitos da medida preventiva até o julgamento definitivo, considerando que a medida preventiva determinaria mudanças estruturais no modelo de negócios do Itaú, sem a conclusão da fase instrutória. Não obstante, a Juíza posteriormente indeferiu o Mandado de Segurança em sede de sentença. Segundo a Juíza, o Itaú não comprovou a existência de práticas similares por outros agentes de mercado. Ademais, a medida seria proporcional, pois estaria em linha com a regulamentação do setor, sem a imposição de obrigações adicionais. Por fim, “No que se refere à violação do contraditório e ampla defesa, tenho que, na presente hipótese, há dois valores que precisam ser compatibilizados: o direito à ampla defesa do Itaú e o direito ao sigilo de dados concorrenciais sensíveis, bem como de outros documentos cujo sigilo é garantido por lei. Entendo que as informações prestadas demonstram que esses valores foram devidamente compatibilizados pelo CADE. Com efeito, embora alguns documentos tenham sido disponibilizados apenas de forma parcial, tenho que a conduta que gerou a atuação do CADE está clara”.
Destaques da Superintendência-Geral do CADE
SG arquiva investigação envolvendo suposta restrição à atividade médica pela Unimed Litoral
A SG decidiu arquivar investigação[4] que buscava apurar supostas restrições, pela Unimed Litoral – Cooperativa de Trabalho Médico (Unimed Litoral), ao exercício de atividade médica com o alegado objetivo de criação de reserva de mercado.
A investigação teve origem em março de 2025, a partir de Representação apresentada por médico oftalmologista. Segundo a Representação, a Unimed Litoral estaria cerceando a sua atuação de outros profissionais de diferentes regiões ao negar filiação como cooperado sem justificativa razoável, enquanto garantiria favorecimento privilegiado a familiares de médicos já cooperados. Nesse sentido, as negativas da Unimed Litoral fariam parte de uma estratégia anticompetitiva com o objetivo de estabelecer reserva de mercado, o que prejudicaria não só profissionais, mas também a qualidade do atendimento prestado aos beneficiários da Unimed Litoral. Dessa forma, a SG instaurou Procedimento Preparatório.
Não obstante, após a instauração do Procedimento Preparatório, a SG decidiu arquivar a investigação. Segundo a SG, “Pelo relato dos fatos, entende-se que o presente feito traz ao conhecimento do Cade discórdia comercial entre as partes, tratando-se, portanto de lide privada apenas, não havendo indícios mínimos de infração à ordem econômica”, sendo que “os órgãos de defesa da concorrência não se prestam a corrigir discordâncias comerciais estabelecidas entre particulares”[5]. Dessa forma, a SG arquivou a investigação por ausência de indícios de matéria de competência do CADE.
SG instaura investigação para apurar o aumento no valor do aluguel de imóveis durante a COP30
A SG decidiu instaurar investigação[6] para apurar suposta influência à adoção de conduta comercial uniforme, por Airbnb Plataforma Digital Ltda. (Airbnb) e Sebrae do Pará (Sebrae-PA), após a realização de curso que teria resultado no aumento do valor do aluguel de imóveis para o período da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP-30), a ser sediada em Belém do Pará.
A investigação foi instaurada de ofício pela SG, em abril de 2025, após tomar conhecimento de matéria jornalística publicada pela UOL intitulada “Após curso no Sebrae, anfitriões do Airbnb cobram 10 vezes mais para COP30”[7]. Segundo a UOL, “Belém deve receber cerca de 60 mil visitantes para a COP30, mas só há cerca de 18 mil vagas nos hotéis da cidade”. O Sebrae-PA teria realizado curso em parceria com o Airbnb para capacitação de locatários, inclusive sobre precificação de aluguel durante a COP30. Após o curso de capacitação, os valores do aluguel de imóveis durante o período de realização da COP-30 teriam aumentado significativamente.
Nesse sentido, a SG instaurou Procedimento Preparatório para analisar se a conduta apurada constituiria influência à adoção de conduta comercial uniforme, matéria sob competência do CADE, encaminhando ofícios ao Airbnb e ao Sebrae-PA.
SG não conhece operação envolvendo a rede de fast-food KFC
A SG decidiu não conhecer operação[8] envolvendo a aquisição, pela Kentucky Foods Chile Limitada (KFC Chile), de controle sobre a operação brasileira da franquia Kentucky Fried Chicken (KFC Brasil), por entender não estarem preenchidos os requisitos de faturamento para notificação obrigatória de operações ao CADE.
A KFC Chile é uma subsidiária do Grupo Degasa, que se dedica à operação de restaurantes no Chile, Venezuela, Colômbia, Equador e Espanha, tendo o Kentucky Fried Chicken (KFC) como sua principal marca. Segundo as Requerentes, a operação representaria a entrada do Grupo Degasa no Brasil por meio da aquisição da KFC Brasil, então detida pela International Meal Company Alimentação S.A. (IMC). Nesse sentido, a operação seria constituída por uma primeira etapa consistente na aquisição de 58,3% do capital social total e votante da KFC Brasil, com ajustes na participação societária conforme novos aportes de capital fossem realizados. As Requerentes notificaram a operação requerendo sua aprovação sem restrições ou, alternativamente, seu não conhecimento, com declaração expressa de que a potencial aquisição de até 100% da KFC Brasil pelo Grupo Degasa por meio de etapas subsequentes constitui um Ato de Concentração único, não demandando novas notificações no contexto da Operação.
A SG decidiu não conhecer a operação, já que o Grupo Degasa não registrou faturamento nem volume de negócios no Brasil no ano anterior à operação, de modo que a operação não seria de notificação obrigatória ao CADE. Não obstante, a SG ressalvou que a análise seria restrita à primeira etapa da operação, sendo que operações futuras poderiam constituir ato de concentração de notificação obrigatória: “as futuras aquisições da KFC Chile na KFC Brasil deverão ser notificadas no momento em que de fato vierem a ocorrer, se vierem a ocorrer, observadas, nesse momento futuro incerto, as regras de notificação obrigatória presentes na legislação concorrencial brasileira”, dado que “mesmo que as etapas estejam previstas em um único contrato e possuam percentuais de aquisição, valores de compra, comprador, objeto-alvo e vendedor idênticos, o simples fato de ocorrerem em momentos afastados no tempo já faz com que cada uma delas configure uma nova aquisição, um novo ato de concentração, ou seja, cada uma delas representa o seu próprio objeto fechado em si mesmo”[9].
Destaques da Sessão de Julgamento
Tribunal condena tabelamento de preços de serviços de fisioterapia e terapia ocupacional
O Tribunal do CADE decidiu[10], por unanimidade, condenar o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO) por influência à adoção de conduta comercial uniforme consistente em tabelamento de preços para serviços de fisioterapia e terapia ocupacional.
A investigação foi instaurada de ofício pela SG em 2021 após tomar conhecimento, por meio de pesquisas no site do COFFITO, de instrumentos normativos que teriam potencial de configurar influência à adoção de conduta uniforme entre concorrentes, tais como resoluções, acórdãos e tabelas de referência de preços que estabeleciam valores mínimos para a prestação de serviços de fisioterapia e terapia ocupacional. A SG encaminhou então ofícios solicitando esclarecimentos aos Conselhos Regionais de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (CREFITOs). O Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional da 15ª Região (CREFITO-15) indicou possuir seis processos éticos abertos e encerrados conforme as normativas do COFFITO. Dessa forma, a SG instaurou processo administrativo contra o COFFITO e o CREFITO-15. Em sua defesa, o COFFITO alegou a ocorrência de prescrição, dado que os fatos sob análise teriam sido apurados em investigação anterior[11], quando a SG reconheceu a incidência de prescrição intercorrente. Ao final da instrução, contudo, a SG recomendou a condenação do COFFITO e do CREFITO-15. Após a recomendação da SG, o CREFITO-15 celebrou Termo de Compromisso de Cessação (TCC) para suspender a investigação.
Durante a 245ª Sessão Ordinária de Julgamento (SOJ), o Conselheiro Relator Carlos Jacques votou pela condenação do COFFITO. Segundo o Relator, não teria ocorrido a prescrição, dado que o conjunto probatório seria mais amplo do que aquele analisado em investigação anterior, sendo que alguns dos atos normativos investigados seriam, inclusive, posteriores ao reconhecimento da incidência de prescrição intercorrente. O Relator entendeu também que a conduta de influência à adoção de conduta comercial uniforme seria um ilícito por objeto, tendo sido demonstrada a autoria e materialidade da conduta, “pois o COFFITO, por meio de elaboração de tabelas de honorários de cunho obrigatório e de resoluções que também revelam a obrigatoriedade de observação dos referenciais estipulados pelos profissionais fisioterapeutas, possuía o objetivo de uniformizar os preços de serviços prestados por fisioterapeutas”. Desse modo, o Relator fixou multa no valor de aproximadamente R$ 3,1 milhões, além de determinar que o COFFITO se abstenha de elaborar e divulgar tabelas de preços impositivas no mercado de serviços de fisioterapia e terapia ocupacional, bem como que remova de seus endereços eletrônicos todas as referências às tabelas impositivas. Os demais membros do Tribunal acompanharam o voto do Relator.
Tribunal condena concessionárias por gun jumping no setor automotivo
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, condenar[12] as empresas Renauto Veículos e Peças Ltda (Renauto) e Navesa Nacional de Veículos Ltda. (Navesa) por consumação de aprovação sem a notificação obrigatória ao CADE (gun jumping) no setor automotivo.
A investigação teve origem em 2020, a partir da resposta da Renault a questionamentos do CADE no âmbito de processo de Denúncia de Ato de Concentração a respeito de transferências de concessionárias nos últimos 10 (dez) anos, em que apontou a Renauto como uma das concessionárias que participou dessas transações. Nesse sentido, a SG instaurou investigação e encaminhou ofício à Renauto, que informou sobre operação consistente na transferência de ativos à Navesa, com sucessão de atividades de concessionária de veículos. Segundo a Renauto, a operação não seria de notificação obrigatória, dado que decorreria de imposição da Renault para substituir as atividades entre concessionárias, sem efeitos sobre a concorrência. Segundo apurado pela SG, contudo, a operação era de notificação obrigatória por caracterizar aquisição de ativo e envolver grupos econômicos que preenchiam o critério de faturamento, mas foi consumada sem a aprovação prévia do CADE, configurando prática de gun jumping.
Durante a 218ª SOJ, realizada em outubro de 2023, o então Conselheiro Relator Luiz Hoffmann apresentou voto pelo reconhecimento da configuração da infração de gun jumping, determinando a notificação da operação ao CADE, mas deixando sobrestada decisão sobre a sanção pecuniária até a decisão de mérito sobre o ato de concentração. Em novembro de 2024, as partes notificaram a operação ao CADE, tendo sido aprovada sem restrições em março de 2025. Nesse sentido, os autos foram redistribuídos à relatoria da Conselheira Camila Cabral Pires Alvez. Antes da definição do valor da multa, as representadas apresentaram proposta de Acordo em Controle de Concentração (ACC) requerendo a aplicação no valor mínimo legal de R$ 60.000,00, dado que as representadas agiram de boa-fé após tomar ciência da obrigatoriedade de notificação da operação, inexistindo dolo ou lesão à concorrência porque a infração foi de baixa gravidade.
A Conselheira Relatora, contudo, apresentou Despacho rejeitando a proposta de ACC, por entender que “Tais alegações, no entanto, não encontram respaldo no histórico do caso. Ressalte-se que a mera juntada de proposta aos autos não é, por si só, suficiente para demonstrar o efetivo interesse das partes em cooperar com a autoridade antitruste”, de forma que a aplicação de multa segundo a jurisprudência do CADE seria em valor superior ao mínimo legal[13]. O Despacho foi homologado por unanimidade pelos demais Conselheiros durante Circuito Deliberativo Virtual. Durante a 245ª SOJ, a Conselheira apresentou voto fixando o valor da multa. A Relatora somou à pena base de R$60.000,00 a alíquota de 0,01% do valor da operação por dia de atraso na notificação, bem como 0,04% sobre o valor final do faturamento médio dos grupos econômicos envolvidos na operação em razão da intencionalidade. Não obstante, a Relatora entendeu que a multa final deveria ser limitada a 20% do valor da operação, com base nos critérios de proporcionalidade e razoabilidade. Dessa forma, o valor da multa correspondeu a R$ 5.360.560,00. Os demais membros do Tribunal acompanharam a Relatora.
Tribunal aprova aquisição da Brasnefro pela DaVita com restrições
O Tribunal do CADE aprovou, com restrições estabelecidas em Acordo em Controle de Concentração (ACC), operação[14] consistente na aquisição, pela DaVita Brasil Participações e Serviços de Nefrologia Ltda. (DaVita), da totalidade das ações da Brasnefro Participações Ltda. (Brasnefro).
A DaVita é subsidiária brasileira da empresa norte-americana DaVita Inc., que possui clínicas de diálise em diversos países. No Brasil, a DaVita atua na prestação de serviços de diálise para pacientes renais, tanto para pacientes crônicos quanto agudos. A Brasnefro faz parte do Grupo Fresenius Medical Care (Grupo FMC), que tem sede na Alemanha e é um fornecedor global de produtos e serviços para pacientes com doença renal crônica. A Brasnefro presta serviços de diálise para pacientes agudos e crônicos em suas clínicas próprias espalhadas pelo território nacional. A operação ensejou sobreposições horizontais nos mercados de serviços de diálise (i) em dimensão regional para pacientes crônicos, que demandam tratamento emergencial e (ii) em dimensão local para pacientes agudos, que demandam tratamento recorrente.
Segundo apurado pela SG, as sobreposições nos mercados relevantes de pacientes agudos nos estados do Rio de Janeiro, Pernambuco e Distrito Federal superariam o patamar de 20% de participação de mercado combinada. Contudo, a SG afastou as preocupações concorrenciais devido às entradas ocorridas nos últimos anos, aos planos de expansão dos concorrentes e à existência de rivalidade potencial. Quanto aos mercados relevantes de pacientes crônicos, a SG identificou que as partes superariam o patamar de 20% de participação de mercado combinada em determinados mercados locais, e existiriam obstáculos à entrada e rivalidade limitada. Ademais, a Clínica Médica de Nefrologia de Alphaville Ltda. (Nefrostar) e a Diaverum Assistência Médica e Nefrológica Ltda. (Diaverum) apresentaram intervenções como terceiras interessadas, apontando preocupações concorrenciais decorrentes da operação. Ao final, a SG recomendou a aprovação da operação com restrições.
No âmbito do Tribunal, as requerentes apresentaram proposta de ACC. Durante a 246ª SOJ, o Conselheiro Relator José Levi Mello apresentou voto pela aprovação da operação condicionada à celebração do ACC. Segundo o Relator, as preocupações concorrenciais relacionadas a altos níveis de concentração nos mercados locais de diálise crônica no Distrito Federal, João Pessoa, Recife, Rio de Janeiro e São Paulo poderiam ser mitigadas mediante remédios estruturais e comportamentais. Os demais membros do Tribunal acompanharam o voto do Relator. O ACC estabelece, dentre outros, os seguintes remédios:
- A alienação de clínicas para eliminar sobreposição horizontal no Distrito Federal, João Pessoa e Recife, bem como para reduzir a concentração no Rio de Janeiro e São Paulo, com a aprovação do comprador previamente ao fechamento da operação (Bloco 1);
- A alienação de clínicas para um grupo econômico distinto do adquirente do Bloco 1, a fim de se reduzir a concentração no Rio de Janeiro, com a aprovação do comprador posteriormente ao fechamento da operação (Bloco 2);
- A proibição de aquisições de empresas ou ativos no segmento de serviços de diálise crônica em São Paulo e Rio de Janeiro por, respectivamente, 3 e 4 anos;
- A obrigatoriedade de notificação ao CADE de todas as operações realizadas pela DaVita no Brasil por cinco anos, ainda que não cumpram os critérios de notificação obrigatória;
- O ajuste de cláusula de não-concorrência para compatibilidade com o prazo e o escopo da jurisprudência do CADE.
Tribunal determina instauração de investigação envolvendo o licenciamento de patentes essenciais ao 5G
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, determinar a abertura de Inquérito Administrativo para apurar supostas práticas da Telefonaktiebolaget L.M. Ericsson (Ericsson) relacionadas ao licenciamento de patentes essenciais à quinta geração de redes de telecomunicação móvel (5G), no âmbito de julgamento de Recurso Voluntário apresentado por Motorola Mobility Comércio de Produtos Eletrônicos Ltda. e Lenovo Tecnologia Brasil Ltda. (Grupo Lenovo) contra decisão da SG que indeferiu seu pedido de medida preventiva.
Segundo o Grupo Lenovo, a Ericsson teria ajuizado ação com pedido de liminar para determinar a cessação de suas patentes no Brasil (tendo tal liminar sido deferida pelo Judiciário) com o suposto objetivo de obter royalties mais elevados em uma negociação global, de forma que seria necessária uma medida preventiva do CADE forçando a Ericsson a cessar o exercício dos direitos relacionados às suas patentes no Brasil. Tal pedido de medida preventiva foi indeferido pela SG devido à ausência de verossimilhança das alegações, o que levou o Grupo Lenovo a apresentar Recurso Voluntário[15]. Em resposta ao Recurso Voluntário, a Ericsson esclareceu que buscou repetidamente negociar o licenciamento de suas patentes essenciais com o Grupo Lenovo em termos FRAND (Fair, Reasonable and Non-Discriminatory), tendo recorrido ao Judiciário como última alternativa após o fracasso de negociações, e que não teria incentivos a qualquer prática anticompetitiva, dado não ser concorrente do Grupo Lenovo no mercado de dispositivos móveis que implementam suas patentes essenciais ao 5G, tratando-se o caso, portanto, de disputa privada. Além disso, a Ericsson apontou inexistir urgência no pedido do Grupo Lenovo, dado que sua participação de mercado aumentou desde a concessão de liminar pelo Judiciário, não havendo qualquer risco de sua exclusão do mercado brasileiro.
O Recurso Voluntário foi distribuído ao Conselheiro Gustavo Augusto de Lima. Entretanto, antes do julgamento, as partes informaram a celebração de acordo de licenciamento global, com pedido de desistência do Recurso Voluntário sendo apresentado pelo Grupo Lenovo.
Durante a 246ª SOJ, o Conselheiro Relator apresentou voto pela homologação do pedido de desistência do Grupo Lenovo. Não obstante, segundo o Relator, “eventual acordo entre as partes não afasta a necessidade de se apurar a possível conduta infracional, uma vez o titular dos bens jurídicos protegidos pela Lei Defesa da Concorrência é a coletividade, não a empresa representante (parágrafo único do art. 1º da LDC). Nesse caso, deve o CADE proceder de ofício a apuração, ainda que a empresa representante desista da sua representação.” Assim, como o Relator entendeu que existiriam indícios de práticas de licenciamento de patentes essenciais ao 5G que mereceriam investigação, foi determinada a abertura de Inquérito Administrativo e o encaminhamento dos autos à SG. Os demais membros do Tribunal acompanharam o Relator.
Destaques do Circuito Virtual
Tribunal determina continuidade de investigação de gun jumping e notificação imediata de parceria entre Azul e Gol
O Tribunal do CADE decidiu, por unanimidade, homologar Despacho de Avocação do Conselheiro Gustavo Augusto de Lima para determinar a continuidade de investigação[16] que busca apurar a consumação de Ato de Concentração sem a aprovação prévia do CADE (gun jumping), consistente em parceria de codeshare entre Azul Linhas Aéreas Brasileiras S.A. (Azul) e GOL Linhas Aéreas S.A (Gol), bem como a notificação imediata da operação ao CADE.
A investigação teve origem em maio de 2024 após a SG tomar conhecimento de comunicados ao mercado anunciando parceria entre Gol e Azul consistente no compartilhamento de voos a serem operados por uma das companhias para comercialização de bilhetes nos canais de venda de ambas as empresas. Ademais, a parceria também permitiria a integração dos programas de fidelidade Smiles e Azul Fidelidade, dado que clientes poderiam acumular milhas em quaisquer programas de fidelidade. Nesse sentido, a SG concluiu que a parceria constituiria contrato associativo de notificação obrigatória ao CADE, nos termos da Resolução nº 17/2016. Em especial, existiria empreendimento comum consistente no compartilhamento recíproco de ativos essenciais ao desenvolvimento das atividades de transporte aéreo regular de passageiros (e.g., aeronaves e sistemas informacionais) entre concorrentes, bem como compartilhamento de riscos e resultados decorrente da natureza da atividade (e.g., responsabilidade solidária, impactos à marca). Não obstante, a SG entendeu que não teria se configurado gun jumping, pois contratos associativos com prazo indeterminado devem ser notificados antes do atingimento de 2 anos de vigência, o que não havia ocorrido.
O Conselheiro Gustavo Augusto de Lima, contudo, apresentou Despacho de Avocação para determinar a continuidade da investigação, bem como a notificação imediata da operação ao CADE. Segundo o Conselheiro, “Diante da relevância da análise desenvolvida pela SG/CADE, das peculiaridades do caso concreto, dos possíveis reflexos para o setor aéreo e para fins de uniformização da orientação de obrigatoriedade de notificação de acordos de codeshare, entendo ser necessária a avocação deste APAC, para um exame mais profundo por parte deste Tribunal”. Ademais, “Tendo constatado que a área técnica concluiu que: i) o acordo de codesharing entre a Azul e Gol não é um acordo de codesharing típico, prevendo mecanismos de cooperação entre concorrentes que fogem do usual; ii) o acordo em tela pode suscitar preocupações concorrenciais, com possíveis efeitos negativos aos consumidores (§219 da nota técnica); e iii) o acordo, se implementado, implicará em sobreposição horizontal entre duas das três principais concorrentes do setor aéreo nacional (§222 da nota técnica), entendo que deve este Tribunal determinar que a operação de codesharing em tela seja imediatamente notificada a esta autoridade para a análise de mérito do referido acordo.”[17] O Despacho de Avocação foi homologado por unanimidade pelos demais membros do Tribunal.
Tribunal homologa proposta de TCC da Álya para suspender dezenove investigações
O Tribunal do CADE homologou, por unanimidade, proposta de Termo de Compromisso de Cessação (TCC) apresentada pela Álya Construtora S.A. (Álya”, atual denominação da Construtora Queiroz Galvão S.A.), para suspender dezenove Processos Administrativos que buscam apurar supostas práticas anticompetitivas em diferentes ramos de obras de infraestrutura e serviços para construção (e.g., ferrovias, rodovias, barragens, obras urbanas e similares).
Por meio do TCC, a Álya reconheceu a participação nas condutas investigadas e se comprometeu a cessar as supostas condutas anticompetitivas, colaborar com as investigações, adotar programa de integridade concorrencial e pagar R$ 125.087.093,50 ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos em vinte parcelas anuais a título de contribuição pecuniária.
Notas de Rodapé
[1] REsp nº 1802319 – CE.
[2] Mandado de Segurança nº 1016133-46.2025.4.01.3400.
[3] Inquérito Administrativo nº 08700.007564/2024-73.
[4] Procedimento Preparatório nº 08700.003129/2025-51.
[5] Nota Técnica nº 24/2025/CGAA11/SGA1/SG/CADE, §§4-5.
[6] Procedimento Preparatório nº 08700.003566/2025-74.
[7] Disponível em: https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2025/03/11/apos-curso-no-sebrae-anfitrioes-do-airbnb-cobram-10-vezes-mais-para-cop30.htm. Acesso em: 09.06.2025.
[8] Ato de Concentração nº 08700.003903/2025-23.
[9] Parecer nº 232/2025/CGAA5/SGA1/SG.
[10] Processo Administrativo nº 08700.003473/2021-16.
[11] Inquérito Administrativo nº 08700.004863/2015-65.
[12] Procedimento Administrativo de Apuração de Ato de Concentração nº 08700.000974/2020-60.
[13] Despacho Decisório nº 15/2025/GAB5/CADE.
[14] Ato de Concentração nº 08700.003691/2024-01.
[15] Recurso Voluntário nº 08700.010219/2024-17.
[16] Procedimento Administrativo para Apuração de Ato de Concentração nº 08700.003565/2024-49.
[17] Despacho Decisório nº 16/2025/GAB3/CADE.